CURRAL DO CONSELHO
O seu Jacinto encontrou o Pedro chácho correndo e resmungando:
“ Credo im Cruiz, é o bicho, Deus zo livre guarde, é o coisa ruim”.
E o Jacinto, fazendo o Pedro parar perguntou:
O que aconteceu? Por que você está tão assustado?
“ Iscute sô” , respondeu o Pedro, “óia o baruio no currá do conseio, é
o coisa ruim”.
De fato , todos ouviram= “bé-bé, bééé, puft, puft, bé, béé”, e
formou-se um grupo de pessoas assustadas, comentando entre si,
__Eu acho que é assombração.
__ Só pode ser assombração.
__ Será que não é o João Vieira, que tá virano lobisome!
__ Virano lobisome é a puta que pariu, viu seu jaguara, já meto o
canivete na sua pança.
__ Discurpe nho João eu não vi que o Senhor tava aqui também.
__Ripita, ripita, si for home, ripita seu mardito.
__” Carma pessoar” falou o Joaquim Brizola, “ agora num é hora de fazer
discutição, é isso que o bicho tá querendo, vamo achá um jeito de espantá o
bicho”
__” Vamos chamá o Gusto Loreiro”, falou o Zé Rocha, “ele faiz um passe
e o coisa vai simbora”.
__” É mior chamá o Bastião Martins ou o Antonio Lope” falou o João
Barbeiro, “qui eles faiz um responso e acarma tudo”.
__” E se chamar o Padre”? perguntou o Amadeu.
__” Acho que não”, atalhou o Felício “O Padre não mexe cum isprito”.
__Oia , óia o Laurindão Sordado tá chegando, ele resorve o causo pra
nois.
__”Ô pessoal, que tumulto é esse? O que está apavorando tanto os Senhores?
Perguntou o recém chegado soldado Laurindo.
__”É que está acontecendo uma coisa estranha lá no curral do conselho”,
respondeu o Jacinto, “ escute só o barulho”.
É todos quietos , puderam ouvir: bé..bé...puft, puft...bé bééé.
__Ocê viu num é mesmo o bicho?
“Calma, calma”, falou o Laurindo, “eu vou ver o que está lá”.
E o Laurindão , policial destemido passo a passo, foi chegando perto do
curral do conselho, que era o local onde eram fechados os animais que
perambulavam pelas ruas da cidade.
Foi chegando devagar, com cuidado, a mão no cabo do revólver, pronto
para sacá-lo em caso de perigo, examinando a cerca feita de bambu, quando viu
um buraco na cerca, e olhando para dentro do curral, soltou uma sonora
gargalhada, e gritou para o povo ainda assustado.
__Venham ver o demônio que estava assustando os nobres senhores!
Sentado , próximo ao palanque central do cercado, estava o Herculano
Bucho com uma corda enrolada no pescoço e
berrando como cabrita.
Quando viram quem era o responsável por toda aquela confusão , a
multidão se enfureceu e só se ouvia mais ou menos isso:
__Ô mardito, vadiu, vamos mostra pra ele...
__Deixa eu dá um chute na bunda dele.
__Vô grudá ele pra guela e quebra os dente dele.
__Vô metê a cinta no lombo dele.
“ Calma, calma” gritou o Laurindo “ Ninguém vai fazer nada, até agora
estavam todos mijando nas calças de medo, agora os cagões criaram coragem? Vou
levá-lo à delegacia onde ele vai se explicar, e vocês vão dormir, seus
valentões de merda”.
Chegando à delegacia, o delegado José Maurício começou a perguntar.
__Porque você fez isso seu Herculano?
__”Pois eu vou contá, seu Zé Valério.
Assim era conhecido o delegado, “ como o senhor sabe, eu trabáio na
fazenda do Ramos a semana inteira, capino café, esta noite, quando eu cheguei
em casa, achei as crianças chorano. A muié mi falo qui elas chorava porque tava
sem leite pra mamá, por que o Vicente Lopes, fiscar da Prefeitura, fecho a
cabrita no currá do conseio e qui eu tinha que
paga dois mirreis pra sorta a cabrita. Como eu num tinha o dinheiro, eu
fiz o seguinte: arrombei a cerca, sortei a cabra pra muié tirá leite pras
crianças e fiquei no lugar dela no currá e de veis im quando eu dava uns
berros”.
Após dar umas boas gargalhadas, o delegado falou ao policial Laurindão.
__Como ele é um homem trabalhador, dê umas três borrachadas no lombo
dele e depois mande ele ir embora, que vá berrar lá na casa dele.
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