Quem não Quer
Sossego?
Jesus dos
Campos, que jamais foi a um campo de futebol e nem podia ser chamado de ruim de
bola, era um homem gordão que tinha caído um tombo, tinha batido a cabeça e
ficara meio “ruim da bola.” Ele tinha um apetite extraordinário, sempre repetia
suas pratadas (serras) e nunca rejeitava comida:”Eu como di tudo, intéfejãoco
arroz e carne de porco, nem que sejedi lata (estômago dilatado) ou só macarrão”.
Monsieur
Jesuzão arriscava sapecar a língua francesa:”Bonsuá (boa tarde=bonsoir),a
qualquer hora do dia, e “na pa de quá”, “comãtalê vu duCalipiá.” Bom, Calipiá
era um antigo bairro de Riversul, onde é
hoje o Bairro Santa Terezinha, agora,... as outras palavras/frases são
irrepetíveis, porque inexistentes ou irregistráveis.
Crianças e
alguns adultos sempre o insultavam, chamando-o de “casadão”, o que o deixava
furioso e jogando pedradas para todo lado. Todo o estoque de pedras de Riversul/Ribeirão
era reservado para ele e para o “Saracura”, o Antonho, que também atirava
pedras só de ouvir alguém assobiando. Foi azar dele descobriremisso:muitas
pessoas, com as quais não concordo e nunca concordarei, viviam assobiando ou
começavam a assobiar quando o viam. E lá iam pedras. Por Deus, que não houve
danos com nenhuma criança. Voltando ao primeiro catador e atirador de pedras,
que era bem mais forte e escutava melhor, eu conversava com ele sem problemas,
chamava-o de Iésus”(desculpem o acento) e curtia suas estorinhas cheias de
neologismos, vindos daquela bocarra cheia de dentes, uns de ouro. Ele contava
de um cavalo que desembestou com ele (essas bestas!)...”Para, cavalinho,
para”(sem desespero na voz, bem lentamente)...”Para, cavalinho, para....(do
mesmo jeito)...”Quando o cavalinho parô, eu fui de “pranchoar” no chão.”
Essa figura
conhecidíssima de Ribeirão/Riversul e Itararé adorava os craxás que ele exibia
por cima de várias camisas e do paletó, mesmo que o sol fosse de rebentar
mamona, como ele dizia, sempre suando nas suas roupas surradas, sem tirar o
chapéu da cabeça.
Meu pai também
gostava de conversar com ele e dizia que oJesuzão tinha um medo terrível da
morte, morria de medo de morrer (não morre mais) e rezava assim a segunda parte
da Ave- Maria: “Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós, pecadores, agora ,
Amém”.
Várias vezes ele parava e “plantava” no bar do Atílio Coluço
e dizia:” Sabe que eu inda não armocei?” Ele almoçava melhor que padre, não
importava a hora e, invariavelmente, agradecia com estas palavras: “Artigo
(Atílio), vancê é mais bão que o Gumercindo.”
Certa ocasião, em Itapeva, perto da rodoviária, chamaram o
Jesus de “casadão” (sabiam também) e ele, sem ter pedras por perto, deu um
murro no primeiro que achou. Sabemos que essa gente é forte, né? Foi um pacote!
Só que quem foi ao chão era um sargento , que o prendeu: ele apanhou mais que
sparring do Mike Tyson das primeiras lutas!
Depois dessa
desagradável experiência, o “casadão” não voltou mais a Itapeva (não tem crase)
e fricou batendo esse trecho de Riversul a Itararé, cidade onde passou seus
últimos dias.
Quando morreu,
provavelmente foi pro céu (Deus o tenha!) e lá chegando, travou com/contra São
Pedro o seguinte diálogo:
São Pedro:
(calmo, bonachão): Qual é o seu nome?
Jesus (o dos
Campos): Jesus.
São Pedro:
Casado?
Jesus: Já tá querenolevá uma pedrada, é? Será que nem aqui
num vô têsussego?Inté aqui vai tê
gente me inferNANDO?
CRÕNICAS NANDÔNICAS